Foi um golpe de estado, entre tantos na história brasileira, que marca o término do Estado Novo e o fim da Era Vargas, ainda que Getúlio retorne ao poder entre 1951-54. Sua deposição, organizada por militares como o General Góis Monteiro, dá início a um período democrático que só será interrompido em 1964 com novo golpe militar. Esse período é marcado, entre tantos fatos, pela Constituição de 1946, pelo desenvolvimentismo do governo Juscelino Kubitschek e a inauguração de Brasília em 1960.

Período Democrático

Motivado pelo contexto de corrida espacial entre a&nbsp; antiga União Soviética e os Estados Unidos, com o&nbsp; lançamento de satélites no espaço entre os anos 1957 e 1958, no Brasil iniciou-se um movimento pela criação de suas bases para a pesquisa espacial e desenvolvimento de tecnologias para esse fim. Por meio do decreto n.51.133 de 3 de agosto de 1961, o então presidente do Brasil, Jânio Quadros, instituiu o Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais, o GOCNAE. Esta iniciativa corresponde às bases daquilo que viria ser o Instituto de Pesquisas Espaciais, o INPE,&nbsp; e dava início no Brasil às atividades relacionadas a utilização e exploração do espaço sideral. A instituição do GOCNAE também foi motivada pela visita do cosmonauta russo Yuri Gagárin ao Brasil, meses depois de ter sido lançado na órbita da Terra, configurando, assim, a primeira missão espacial tripulada da humanidade. Entusiasmado, o presidente Jânio Quadros aproveitou o período que o expedicionário passou&nbsp; pelo Brasil e lançou o decreto que criava o GOCNAE com as seguintes atribuições: estudar e propor a Política Espacial Brasileira e a legislação que lhe daria suporte; viabilizar a Comissão Nacional de Atividades Espaciais e todo seu conjunto normativo; coordenar e incentivar os trabalhos e estudos relacionados às atividades espaciais;&nbsp;firmar os acordos necessários à instalação da sede em terrenos do Patrimônio da União;&nbsp;administrar as obras e serviços necessários ao plano de criação da Comissão Nacional de Atividades Espaciais;&nbsp;e promover o desenvolvimento de intercâmbio técnico científico e a cooperação internacional, a promoção da formação de especialistas na área e a coordenação entre as atividades espaciais e a indústria brasileira. Um ano depois, as obras das futuras instalações do GOCNAE estavam em andamento no local escolhido, São José dos Campos, e assim materializaram parte da lei instituída pela primeira política espacial brasileira.

Fotografia em preto em branco mostrando parte das obras iniciais do Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (GOCNAE), em 1962. A imagem mostra a visita feita pelos militares, da esquerda para a direita, Joelmir Campos de Araripe de Macedo (Ministro da Aeronáutica), Aldo V. da Rosa (GOCNAE) e George de Morais (IPD/CTA). Em seguida, os pesquisadores do CNPq, Athos da Silveira Ramos e José Cândido. Em 1971, com a criação do INPE, as instalações passaram para a instituição recém-criada dando origem aos primeiros laboratórios e sede administrativa.

Fotografia das obras iniciais do GOCNAE, em São José dos Campos, em 1962

A criação do Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (GOCNAE) em 1961

Em política científica e cooperação internacional, ressaltamos as relações entre a política - interna e externa - e a ciência. Por um lado, a ciência pode orientar algumas tomadas de decisões políticas que impactam diretamente em nossas vidas. Da mesma forma, negar a ciência pode ter efeitos catastróficos. Por outro lado, sem políticas de incentivo e financiamento, não há ciência. Essa relação funciona, portanto, em via de mão dupla e muitas vezes envolve atores nacionais e internacionais.

Política Científica e Cooperação Internacional

As relações políticas e diplomáticas no desenvolvimento da ciência.

Diferentemente da monarquia, na qual o poder é concentrado nas mãos de um rei ou imperador, na república espera-se que o poder emane do povo, que elege os seus representantes. Com o declínio do prestígio do governo de Pedro II, a ideia de se instituir uma república no Brasil começou a ganhar força. Existiram diversos projetos e várias tentativas regionais foram realizadas até que, em 15 de novembro de 1889, um golpe liderado pelos militares enviou o monarca para o exílio, tomando seu lugar.

Primeira República

Mesmo antes da criação de uma associação de caráter internacional, a colaboração entre diferentes países era uma característica das pesquisas na área da astronomia. O projeto da Carta do Céu, por exemplo, iniciado em 1887, contava com o trabalho colaborativo de 20 observatórios em todo o mundo. No entanto, após o fim da Primeira Guerra Mundial, o desejo de formalizar laços de cooperação internacional culminou com a fundação de associações como a International Research Council (Conselho Internacional de Pesquisa) e a International Astronomical Union (União Astronômica Internacional).Fundada em 1919, a União Astronômica Internacional tinha o objetivo de formalizar a cooperação internacional na área, promovendo investigações astronômicas e a troca de informações e experiências entre astrônomos e observatórios ao redor do mundo. Entre seus membros iniciais estavam países como a Inglaterra, os Estados Unidos, o Canadá, o Japão, entre outros. A Alemanha, apesar de ser considerada uma referência na área, estava vedada devido à sua participação na Primeira Guerra Mundial, o que revela como o contexto geopolítico do período entreguerras teve influência na internacionalização da ciência.O Brasil foi convidado para participar em 1922, por meio de convite feito à Academia Brasileira de Ciências, uma vez que os países-membros eram representados por associações científicas nacionais. A academia encaminhou o convite para o governo brasileiro que, além de identificar a oportunidade como uma forma de desenvolver a ciência nacional, entendia a participação em uma associação científica internacional como uma chance para ganhar espaço no contexto geopolítico global. Sendo assim, o governo nomeou Henrique Morize, diretor do Observatório Nacional, para representar o Brasil na primeira Assembleia Geral que seria realizada em Roma.Acompanhado de Tobias de Lacerda Martins Moscoso, Morize embarcou no navio Alba no dia 4 de março de 1922, em momento que ficou registrado em fotografia. A assembleia em Roma, no entanto, ocorreu apenas entre os dias 2 e 10 de maio, contando com a participação de 207 membros representando 19 países, sendo o Brasil o único país sul-americano a participar da reunião. Ainda que a participação brasileira na União Astronômica Internacional tenha sido interrompida em 1938, sendo retomada apenas na década de 1960, o Brasil contribuiu de forma significativa, principalmente em relação aos estudos sobre a variação da latitude, uma vez que permaneceu como o único país do hemisfério sul a realizar esse tipo de estudo até a entrada do Observatório de Córdoba, na Argentina, em 1928.

Fotografia em preto e branco mostrando um grupo de homens em frente a uma embarcação. Na frente, podemos observar Henrique Morize, de chapéu branco e, do seu lado direito, o engenheiro Tobias de Lacerda Martins Moscoso. A fotografia foi tirada em 4 de março de 1922 por ocasião do embarque a bordo do navio Alba com direito à Europa onde Morize participaria da Primeira Assembleia Geral da União Astronômica.

Fotografia dos cientistas embarcando para a Primeira Assembleia Geral da União Astronômica em 1922

Primeira Assembleia Geral da União Astronômica Internacional

A ideia de transferir a capital brasileira do litoral, no Rio de Janeiro, para o interior era antiga e aparece por diversas vezes na história do Brasil, mesmo antes de sua independência. Para o diplomata e historiador Francisco Adolfo de Varnhagen, a mudança da capital para o centro do país facilitaria a integração do território e afastaria o Brasil de seu passado colonial, quando a aproximação do mar facilitava a conexão com a metrópole. Quando publicou A questão da capital: marítima ou no interior? (1877) traçou um breve histórico da discussão e defendeu que a capital deveria estar localizada no centro “como está no corpo o coração”.O debate foi retomado na assembleia constituinte em 1890 quando Lauro Müller apresentou uma proposta sugerindo a transferência da capital para uma área a ser oportunamente demarcada no planalto central. Assinada por 80 deputados e senadores, sua emenda foi inserida na constituição de 1891, a primeira do período republicano. No ano seguinte, o congresso aprovou a formação da Comissão Exploradora do Planalto Central do Brasil, organizada pelo Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas e chefiada por Luiz Cruls, então diretor do Observatório Astronômico do Rio de Janeiro. Para compor o grupo, Cruls convidou astrônomos como Julião de Oliveira Lacaille e Henrique Morize, médicos como o higienista Antônio Martins de Azevedo Pimental, o geólogo Eugen Hussak, o botânico Ernesto Ule, o farmacêutico Alfredo José de Abrantes, além de um contingente de ajudantes e técnicos, totalizando 21 membros.Equipados com teodolitos, lunetas, bússolas, podômetros, instrumentos meteorológicos e até mesmo uma câmera fotográfica, entre outros equipamentos, a comissão partiu do Rio de Janeiro em junho de 1892 seguindo o roteiro indicado anteriormente por Varnhagen. A viagem começou pela ferrovia, chegando até o final dos trilhos da Companhia Mogiana de Estradas de Ferro em Uberaba, dali seguindo a cavalo até Pinerópolis, Santa Luzia e Formosa. No planalto central, os cientistas demarcaram um quadrilátero de 160 por 90 km, utilizando o mesmo método de determinação de fronteiras empregado nos Estados Unidos, dando preferência ao traçado de uma área geométrica regular. O grupo foi dividido em quatro equipes, cada uma chefiada por um cientista, sendo os líderes Henrique Morize, Tasso Fragoso, Antônio Cavalcanti e o próprio Cruls. Cada equipe foi direcionada a um vértice do quadrilátero, seguindo a viagem explorando a geografia e a natureza do planalto central brasileiro, e retornando para o ponto de encontro. Demarcado aquele que ficou conhecido como Quadrilátero Cruls, a comissão retornou ao Rio de Janeiro em março de 1893.Além de montar uma exposição com mapas, fotografias e amostras do solo, da fauna e flora do planalto central, dois relatórios foram publicados: um com resultados parciais, apresentado ao governo em 1893, e outro completo, publicado em 1894. O texto era dividido em duas partes, sendo a primeira composta pelos relatórios dos chefes das quatro equipes e a segunda por dados específicos sobre questões como a geologia e a botânica. Na parte redigida por Cruls, o astrônomo ainda incluiu informações sobre as possibilidades de exploração das riquezas naturais na região e uma introdução histórica da questão da transferência da capital. O trabalho realizado serviu de base para outra comissão, a Comissão de Estudos da Nova Capital da União, organizada no ano seguinte e para a construção de Brasília décadas mais tarde.

Na fotografia em preto e branco vemos um acampamento da expedição da Comissão Exploradora do Planalto Central realizada entre 1892 e 1894. Não há indicação do local, que observamos ser uma clareira defronte uma floresta de árvores frondosas. Em frente uma casa de madeira com dois mastros à frente, um grupo de cinco homens está de pé olhando para a câmera. Henrique Morize possivelmente é o que está na ponta esquerda. Entre eles, uma luneta astronômica está montada e apontada para o céu.

Fotografia de acampamento da Comissão Exploradora do Planalto Central

Comissão Exploradora do Planalto Central do Brasil

Embora tivesse apenas 15 anos, D. Pedro II teve sua maioridade antecipada para poder assumir o trono como imperador do Brasil em 1840. Conhecido por ser um monarca ilustrado e um amigo das ciências, seu governo é marcado pela expansão da urbanização, pelo desenvolvimento das ciências, pela prosperidade econômica impulsionada pela exportação do café, pela abolição da escravatura, mas também pela Guerra da Tríplice Aliança ou Guerra do Paraguai, maior conflito bélico na história do país.

Segundo Reinado

O desenvolvimento de ferrovias, de linhas telegráficas e da navegação a vapor, ao longo do século 19, aproximou cidades e nações distantes. No entanto, a inexistência de um horário comum dificultava a previsão dos horários de partida e chegada de trens e navios, especialmente em lugares onde cada cidade calculava a sua hora usando critérios próprios. Diante desse cenário, era importante criar um padrão que pudesse ser adotado internacionalmente. Para resolver a questão, os cientistas sugeriam a adoção de um marco zero a partir do qual a hora poderia ser calculada para qualquer lugar do mundo. O plano era selecionar um meridiano, uma das linhas verticais que corta o globo terrestre e, a partir dele, calcular a longitude e a hora universal. Enquanto a medida da latitude parecia ser naturalmente mensurada pelos paralelos a partir dos polos, a medida da longitude – importante na determinação da hora devido ao movimento de rotação da Terra – carecia de um ponto inicial sobre o qual os cientistas estivessem de acordo. O Brasil, por exemplo, utilizava três meridianos: um situado no Observatório do Rio de Janeiro, para a confecção de mapas; o meridiano do Observatório de Paris, para a navegação costeira; e as medidas definidas pelo Coast and Geodetic Survey dos Estados Unidos.Alguns congressos internacionais foram realizados para definir internacionalmente o meridiano zero, mas sem sucesso até que, entre outubro e novembro de 1884, foi realizada a Conferência Internacional do Meridiano, em Washington. Um total de 41 representantes, de 26 países diferentes, participaram do evento no qual o enviado brasileiro foi Luiz Cruls, então diretor do Imperial Observatório do Rio de Janeiro. Essa foi a primeira missão científica do astrônomo de origem belga após ter assumido a direção da instituição. Durante a conferência, duas propostas se destacaram. Liderado pelo Reino Unido e pelos Estados Unidos, um bloco defendia a adoção do meridiano que passava sobre uma das principais lunetas do Real Observatório de Greenwich, na Inglaterra. Outro bloco, liderado pela França, argumentava que o meridiano zero deveria ser, assim como a própria ciência, neutro e, portanto, não deveria passar sobre um país. De acordo com a proposta da neutralidade, Cruls acreditava que um país como a França se recusaria a adotar o meridiano de outra nação. Contudo, embora o Observatório de Paris fosse uma referência no campo da astronomia, a maior parte da navegação internacional utilizava o The Nautical Almanac publicado pelo observatório inglês para a determinação da longitude. Na votação realizada na conferência, a proposta para adotar o meridiano de Greenwich como marco zero recebeu 22 votos a favor, apenas 1 contra e 2 abstenções, uma delas de Luiz Cruls. A partir de então, diversas nações passaram a gradualmente adotar o meridiano de Greenwich como marco para a medida da longitude, incorporando também os fusos horários criados em relação ao tempo médio de Greenwich (Greenwich Mean Time, ou GMT).A votação para a escolha de Greenwich como meridiano inicial demonstra tanto o papel da ciência para a padronização de medidas universais quanto o caráter arbitrário de algumas medidas que tomamos como naturais. Revela, ainda, como o predomínio da marinha inglesa sobre a navegação internacional foi um importante fator na escolha do meridiano, evidenciando as relações entre a geopolítica e a ciência.

O documento representa o mapa de assentos para uma mesa retangular de grandes dimensões onde estarão sentados 41 cientistas representando instituições de diversos países diferentes presentes na Conferência Internacional do Meridiano realizada em Washington, Estados Unidos, em 1884, para a definição do meridiano inicial. Sentado entre os representantes da Colômbia e do Império Austro-Húngaro estava Luiz Cruls, representando o Brasil e o Imperial Observatório do Rio de Janeiro.

Mapa de assentos na Conferência Internacional do Meridiano de 1884

Conferência Internacional do Meridiano

Também conhecida como “Segunda Missão Cruls”, a Comissão de Estudos da Nova Capital da União tinha como objetivo dar continuidade aos trabalhos iniciados anteriormente pela Comissão Exploradora do Planalto Central. Enquanto esta última expedição teve como finalidade fazer o reconhecimento do terreno e da natureza do planalto central do Brasil, a nova comissão de estudos pretendia definir o melhor local para a construção da futura capital do país dentro da área demarcada pela comissão anterior, na região conhecida como Quadrilátero Cruls. A transferência da capital, então localizada no Rio de Janeiro, para uma área no centro geométrico do país era uma proposta antiga e que aparece por diversas vezes na história do Brasil. Para o diplomata e historiador Francisco Adolfo de Varnhagen, a mudança da capital para o centro do país facilitaria a integração do território e afastaria o Brasil de seu passado colonial, quando a aproximação do mar facilitava a conexão com a metrópole. Quando publicou A questão da capital: marítima ou no interior? (1877) traçou um breve histórico da discussão e defendeu que a capital deveria estar localizada no centro “como está no corpo o coração”. Com a constituição de 1891, a proposta foi transformada em artigo constitucional e a Comissão Exploradora do Planalto Central deu início ao projeto que só seria concretizado décadas mais tarde com a construção de Brasília.Realizada entre julho de 1894 e dezembro de 1895, a Comissão de Estudos da Nova Capital da União foi organizada pelo Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas e chefiada por Luiz Cruls, então diretor do Observatório Astronômico do Rio de Janeiro. Para assegurar a eficiência da expedição, a comitiva foi dividida em cinco equipes menores, cada uma direcionada para explorar uma área diferente. Elas foram lideradas pelo astrônomo Henrique Morize, pelo engenheiro Hastimphilo de Moura, pelo militar Celestino Alves Bastos, pelo engenheiro Alípio Gama e pelo próprio Luiz Cruls. Entre seus membros, estavam geólogos, médicos, astrônomos, engenheiros e até um botânico, o francês Auguste François Marie Glaziou.Além dos levantamentos topográficos e hidrográficos da região, a comissão também tinha como objetivo definir o melhor local para a construção de uma estrada de ferro que ligasse as cidades de Catalão, em Goiás, a Cuiabá, no Mato Grosso. A existência de uma ferrovia era condição importante para que a nova capital não ficasse isolada do restante do território. Embora a sugestão de Cruls, registrada no relatório da Comissão Exploradora do Planalto Central, fosse a construção de uma linha que ligasse diretamente o Rio de Janeiro até a área demarcada para a nova capital, a solução mais imediata era aproveitar das linhas existentes naquele momento, sendo Catalão já servida por duas estradas de ferro.Em um relatório enviado ao ministro em 1886, Cruls informava sobre os resultados obtidos e afirmava: "Tenho a mais absoluta convicção de que da mudança da capital, a par dos interesses políticos que a ela se prendem, resultará para o Brasil, sua prosperidade e desenvolvimento futuro, as mais benéficas consequências, que atualmente ninguém pode avaliar”, revelando seu otimismo em relação à transferência da capital. No entanto, só com a construção de Brasília ao final da década de 1950 é que o plano previsto na constituição de 1891 finalmente se concretizaria.

Na fotografia em preto e branco vemos um grupo com quatro homens em pé vestindo chapéus, botas longas e casacos compridos. O segundo, da esquerda para a direita, é Henrique Morize. Do seu lado esquerdo, provavelmente está o geólogo Eugen Hussak. Os outros dois provavelmente são Antônio Cavalcanti Albuquerque, engenheiro militar e Guilherme Meyer, auxiliar técnico. Os quatro faziam parte do grupo chefiado por Morize na expedição da Comissão de Estudos da Nova Capital da União realizada entre 1894 e 1895.

Fotografia da Comissão de Estudos da Nova Capital da União

Comissão de Estudos da Nova Capital da União

A década de 1940 marcou um aumento do interesse pelo potencial da energia nuclear, especialmente após os Estados Unidos demonstrar o seu grande poder de destruição ao lançar bombas sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki. O massacre fez com que, no ano seguinte, as Nações Unidas criassem a Comissão de Energia Atômica com o objetivo de regulamentar a produção e o uso dessa energia. Nessa comissão, o Almirante Álvaro Alberto da Motta e Silva foi o representante do Brasil e um dos principais defensores do desenvolvimento do setor nuclear no país. No mesmo ano, em 1946, foi implementada a Política Nuclear Brasileira, dando início a um projeto de Estado nesse sentido.No entanto, a falta de recursos humanos e materiais no país era um desafio. Apoiado por diversos cientistas, Álvaro Alberto propôs a criação do Conselho Nacional de Pesquisas, com o objetivo de ampliar o fomento da pesquisa científica e a formação de pessoal capacitado. O CNPq foi fundado em 15 de janeiro de 1951, e abarcava uma Comissão de Energia Atômica composta por cientistas e membros do governo. Dentre suas primeiras ações, estava o estabelecimento de acordos de cooperação internacional.Um contrato firmado em 1953 entre o CNPq, a companhia francesa Societé des Produits Chimiques des Terres Rares e o Comissariado de Energia Atômica da França permitiu o intercâmbio de cientistas entre os dois países. Da França, físicos como Francis Perrin vieram ao Brasil, enquanto nosso país montou uma expedição chefiada por Alexandre Girotto, chefe da seção de físico-química do Laboratório de Produção Mineral do Departamento Nacional de Produção Mineral. Entre seus companheiros estavam Walter Ferreira e João Ricciotti Pucci, autor do desenho em destaque. Na carta enviada à Girotto, Pucci descrevia um dos experimentos realizados pela equipe, apresentando o esquema de um aparelho de cloração de minério utilizado na tentativa de purificar minerais que eram extraídos de Poços de Caldas, em Minas Gerais, e enviados para a Europa. Segundo Girotto, a equipe trabalhou de forma intensiva, não passando “24 horas sequer entre um insucesso e o início de uma nova experiência”. Como resultado, em 8 de janeiro de 1954, utilizando um método aperfeiçoado por Walter Ferreira, a equipe obteve a primeira amostra de urânio metálico brasileiro nuclearmente puro. Esse foi um feito “auspicioso”, segundo descreveu Álvaro Alberto, e chamou a atenção dos cientistas franceses, que redigiram em nome do CNPq um pedindo de patente internacional para o método utilizado pelos brasileiros.No entanto, apesar do bom andamento das pesquisas na Europa, o fim da missão liderada por Girotto foi abrupto. O desenvolvimento da energia nuclear no Brasil, incentivado por Álvaro Alberto e pelo CNPq, foi interrompido quando o suicídio do então presidente Vargas encerrou o apoio governamental que possuía. O novo governo de Café Filho não tinha o setor nuclear como uma de suas prioridades. Em setembro de 1955, mesmo sem ter concluído o contrato, os brasileiros foram ordenados a retornar ao Brasil. Segundo Girotto: “Voltei recebendo ordens de não falar sobre o realizado e [...] pouco tempo depois todo o trabalho entrou no esquecimento”. Esse episódio nos mostra que existem relações importantes entre a ciência e a política, evidenciando como mudanças de governo e de políticas de financiamento podem proporcionar novos avanços ou fazer com que trabalhos de anos caiam no esquecimento.

Conjunto textual com 15 páginas do "Relatório dos trabalhos efetuados na Usines des Produits Chimiques de Thaims" datado de maio de 1954. O relatório apresenta informações sobre os experimentos realizados na França com os minérios recebidos de Poços de Caldas, Minas Gerais, incluindo o desenho feito à mão de um aparelho para cloração de minério com indicações de seus componentes. O relatório foi assinado por João Ricciotti Pucci e destinado à Alexandre Girotto.

Esquema para aparelho de cloração de minério por João Ricciotti Pucci

Primeira amostra de urânio metálico brasileiro nuclearmente puro

O século 19 foi um período importante na história da
fotografia, marcado pelo desenvolvimento de aparelhos como o daguerreótipo, pelo
aperfeiçoamento do processo de fixação das imagens e pelo surgimento da
fotografia colorida. Na segunda metade do século, a fotografia começou a chamar
a atenção dos astrônomos que, ao combinar chapas fotográficas com suas lunetas,
criaram o astrofotógrafo ou equatorial fotográfica, instrumento que permitia fotografar
os astros. Na França, os irmãos astrônomos Paul e Henry Prosper, trabalhando
com o construtor Paul Gautier, construíram uma equatorial fotográfica de grande
precisão, que permitia registrar astros muito distantes. Na astronomia, essa
distância é medida pela magnitude, que se relaciona com a luminosidade do
objeto. Quanto maior a magnitude, menor a luminosidade e, portanto, mais
distante o objeto está do observador. O astrofotógrafo construído por Gautier e
os irmãos Prosper permitia a observação de astros até a 14ª magnitude, mais ou
menos tão distantes quanto Plutão.O desenvolvimento desse instrumento foi uma das motivações
que levou Ernest Mouchez, diretor do Observatório de Paris, a organizar o Congresso
Astrofotográfico Internacional. O evento foi realizado entre 16 e 27 de abril
de 1887 e contou com a presença de 56 convidados, sendo 37 estrangeiros de 15
países diferentes. Dentre eles, Luiz Cruls, diretor do então Imperial
Observatório do Rio de Janeiro. Durante o dia, os astrônomos se encontravam
para discutir a organização de um grande projeto de colaboração internacional.
À noite, aproveitavam da programação cultural oferecida pelos anfitriões, que
incluía jantares e apresentações musicais que serviam como momentos de descontração
e sociabilidade científica.Nas atas das reuniões, publicadas pela Academia de Ciências
de Paris, percebemos que a fotografia era considerada um “auxiliar maravilhoso
e poderoso” da astronomia e que sua utilização seria fundamental para cumprir
os objetivos definidos pelo grupo. O primeiro deles, a produção de um atlas denominado
Carta do Céu que reuniria milhares de fotografias produzidas por diferentes
observatórios ao redor do mundo, cada um encarregado de estudar uma zona específica
no céu. O segundo objetivo era a produção de um catálogo astrográfico contendo
a posição de todas as estrelas até a 11ª magnitude. O projeto era ambicioso,
dependia de um investimento inicial considerável para adquirir um astofotógrafo
nos padrões daquele construído por Gautier e os irmãos Prosper e estimava-se
que levaria cerca de dez anos até ser concluído.A participação brasileira, contudo, foi encerrada
precocemente. Embora D. Pedro II tenha doado o instrumento, que veio da França
em 1889, as instalações do observatório no Morro do Castelo não eram adequadas
para a sua montagem. O imperador chegou a doar uma fazenda em Santa Cruz, mas o
espaço também não era ideal. Só em 1921, com a transferência para São
Cristóvão, é que uma cúpula foi construída para a equatorial fotográfica, mas
outro instrumento foi colocado em seu lugar. Ao problema espacial se somavam
outros: a falta de funcionários, a tomada do observatório durante a Revolta da
Armada, e o envolvimento de Cruls com as expedições ao planalto central. Outros
observatórios também encontraram obstáculos, muitos desistiram, e apenas metade
publicou fotografias para a Carta do Céu, que nunca foi concluída. Mais bem
sucedido, o catálogo astrográfico foi utilizado posteriormente na produção de catálogos
mais modernos.

Fotografia de Félix Nadar retratando o grupo de cientistas reunidos por ocasião da realização do Congresso Astrofotográfico Internacional organizado por Ernest Mouchez no Observatório de Paris em 1887. A fotografia, que pretende criar um registro memorial da reunião desses cientistas em um dos primeiros projetos de cooperação internacional em astronomia apresenta o grupo presente na ocasião, composto homogeneamente por homens brancos.Estão presentes na fotografia, em ordem alfabética: Adalbert Krueger, Aimé Laussedat, Albert Gustav Winterhalter, Anders Donner, Andrew Ainslie Common, Benjamin Baillaud, Bouquet de la Grye, Carl August von Steinheil, Carl Frederick Pechüle, Charles Wolf, Christian Heinrich Friedrich Peters, Cecilio Pujazon, David Gill, Edmund Weiss, Edward Knobel, Eduard Schönfeld, Ernest Mouchez, Étienne Alfred Émile Gautier, Félix Tisserand, Francisco Beuf, François Folie, Frederico Thomaz Oom, Georges Rayet, Henry Chamberlain Russell, Hendricus Gerardus van de Sande Bakhuyzen, Hermann Carl Vogel, Hervé Faye, Hippolyte Fizeau, Hugo Gyldén, James Francis Tennant, Jean Abraham Chrétien Oudemans, Jean-Charles Trepied, Josef Maria Eder, Joseph Bertrand
Jules Janssen, Klas Bernhard Hasselberg, Luiz Ferdinand Cruls, Maurice Loewy, Nils Dunér, Oswald Lohse, Paul Ferdinand Gautier, Paul Henry, Pietro Tacchini, Prosper Henry, Stephen Joseph Perry, Thorvald Nicolai Thiele e William Christie.

Fotografia dos cientistas reunidos durante o Congresso Astrofotográfico Internacional de 1887

Programação de um evento social realizado no Observatório de Paris em 19 de abril de 1887 por ocasião da reunião de astrônomos de diversos países participantes do Congresso Astrofotográfico Internacional organizado por Ernest Mouchez, então diretor do observatório da capital francesa. A programação, que conta majoritariamente com artistas franceses, inclui a apresentação de fragmentos de concerto, trechos de óperas cômicas, valsas e performances da Comédia Francesa. Representando o Brasil, Luiz Cruls, então diretor do Imperial Observatório do Rio de Janeiro, e sua esposa, Maria Margarida de Oliveira Cruls, estavam presentes durante o evento. A reunião de cientistas em eventos sociais e culturais é comum durante a realização de congressos, transformando esses eventos em espaços importantes de sociabilidade científica, permitindo a troca de informações, a realização de parcerias e a ampliação das redes sociais e institucionais dos cientistas presentes.

Programação de um evento social realizado no Observatório de Paris em 19 de abril de 1887

Congresso Astrofotográfico Internacional de 1887

Em 1873 a biblioteca do Imperial Observatório do Rio de Janeiro, então denominação do Observatório Nacional, recebeu do Observatório Real de Greenwich, a coleção completa do Almanaque Náutico. A oferta pode ser considerada um dos marcos para a formação desta biblioteca, um dos espaços importantes da instituição por possuir obras que auxiliavam não apenas na formação técnico-científica de engenheiros e militares, mas na produção de dados científicos. Este Almanaque é uma publicação anual iniciada em 1767 e seu primeiro volume foi organizado pelo astrônomo real e diretor do Observatório de Greenwich, Nevil Maskelyne (1732 - 1811). A publicação regular das efemérides astronômicas, catálogo de estrelas e tabelas visava “auxiliar no desenvolvimento da Astronomia, Geografia e Navegação", algo importante para não apenas para a ciência mas, para o aprimoramento das navegações marítimas.Ao longo dos séculos XVIII e XIX, a publicação tornou-se referência não apenas para a Marinha e Companhias de Comércio do Império Britânico, mas foi amplamente utilizado por navegantes e hidrógrafos de outras nações. Em seu primeiro volume, foram publicadas as tabelas da Lua elaboradas por Johann Tobias Mayer (1723-1762), consideradas as mais acuradas para a determinação da longitude em alto mar com segurança, e isso que era um desafio para a época.No Imperial Observatório a publicação também foi reconhecida por sua qualidade mesmo antes da chegada da coleção completa nos anos 1870. Logo em 1852, mesclado com outras obras, o Almanaque foi base para dados publicados na primeira publicação da instituição: Efemérides do Imperial Observatório em 1852. E posteriormente volumes foram utilizados como fonte dados para diversos trabalhos desenvolvidos pela instituição como por exemplo: nas observações do Trânsito de Vênus em 1882; artigo da Revista do Observatório de 1886 sobre ocultações e eclipses; e o Terceiro Tomo dos Anais do Imperial Observatório de 1887 (dedicado ao Trânsito de Vênus e que utilizou tabelas do Almanaque do volume de 1882). Sendo um importante periódico para a execução de atividades de campo e para publicações de dados científicos.A chegada do Almanaque Náutico à Biblioteca do Observatório em 1873 foi informada em relatório do Ministério da Guerra destacando a autoria do Astrônomo Real de Greenwich George Biddel Airy (1801-1892) que remeteu a coleção. O então diretor interino do Observatório, Visconde de Prados (1815-1882), ressaltou no documento que essa e outras publicações científicas estrangeiras recebidas eram fruto do reconhecimento e prestígio do diretor Emmanuel Liais (1826-1900), que encontrava-se em viagem pela Europa.O envio pelo Observatório de Greenwich de sua publicação para a biblioteca do Observatório fazia parte da formação de uma rede de trocas de dados entre observatórios por meio da permuta de suas publicações. Essa prática, que era uma atribuição da biblioteca do Imperial Observatório do Rio de Janeiro, reforçou o papel desta instituição na circulação de dados obtidos a partir de práticas observacionais regulares no hemisfério sul favorecendo o intercâmbio de ideias, técnicas e instrumentos.A Coleção do Almanaque Náutico continuou sendo atualizada pelo Observatório Nacional até os anos 1980 e os volumes podem ser consultados em sua Biblioteca e até os dias de hoje o Almanaque é publicado pelo órgão administrativo responsável, o Escritório do Almanaque Náutico de Sua Majestade, podendo ser consultado no site do Observatório de Greenwich.

O Almanaque, representado aqui por seu frontispício, é uma publicação anual iniciada em 1767 e seu primeiro volume foi organizado pelo astrônomo real e diretor do Observatório de Greenwich, Nevil Maskelyne (1732 - 1811). A publicação regular das efemérides astronômicas, catálogo de estrelas e tabelas visava “auxiliar no desenvolvimento da Astronomia, Geografia e Navegação", algo importante para não apenas para a ciência mas, para o aprimoramento das navegações marítimas. Em seu primeiro volume, foram publicadas as tabelas da Lua elaboradas por Johann Tobias Mayer (1723-1762), consideradas as mais acuradas para a determinação da longitude em alto mar com segurança, e isso que era um desafio para a época.

Almanaque Náutico (Nautical Almanac)

Recebimento do "Almanaque Náutico" de Greenwich pela Biblioteca do Observatório Nacional

Em indivíduos e instituições, destacamos não só cientistas com instrução formal, mas todos os indivíduos que contribuíram com a construção do conhecimento científico. Em alguns contextos, como determinadas expedições científicas, indígenas e escravizados, entre outros, foram importantes colaboradores e, por isso, merecem lugar na história da ciência e da tecnologia brasileira. Ao mesmo tempo, evidenciamos também os espaços de ciência - formais ou não - onde esses indivíduos circularam e atuaram.

Indivíduos e Instituições

A história da ciência por meio de seus atores e espaços.

Em 1885, Ernest Mouchez, diretor do Observatório de Paris, enviou uma carta para Luiz Cruls para consultá-lo sobre a organização de um ambicioso projeto internacional de mapeamento fotográfico dos céus. O diretor do então Imperial Observatório do Rio de Janeiro participou do Congresso Astrofotográfico Internacional que foi realizado em 1887 e contou com cientistas de 15 países diferentes. Durante o evento, ficou decidido que os astrônomos produziriam atlas denominado Carta do Céu que reuniria milhares de fotografias produzidas por diferentes observatórios ao redor do mundo.Para a produção da Carta do Céu, era essencial garantir a padronização das fotografias, especialmente porque se esperava que elas capturassem todos os corpos celestes até a 14ª magnitude. Na astronomia, a magnitude é uma forma de medir a distância de um objeto por meio de sua luminosidade. Quanto maior a magnitude, menor a luminosidade e, portanto, mais distante o objeto está do observador. Sem um instrumento adequado e sem possibilidade de adquirir verbas para a aquisição do astrofotógrafo necessário para o projeto, o Observatório Nacional dependeu da doação do instrumento. O imperador Pedro II, que se encontrava na França durante a realização do congresso, comprou a grande luneta, que chegou ao Brasil dois anos depois em 1889. No entanto, as instalações do observatório no Morro do Castelo não eram adequadas para a sua montagem, que precisava de alicerces sólidos que evitassem trepidações que prejudicariam a precisão das observações. Ainda que Pedro II tenha tentado resolver a questão doando as terras da Imperial Fazenda Santa Cruz, o local também não era adequado e, além disso, o observatório não possuía verba para a construção de uma cúpula para abrigar o instrumento. A cúpula adequada só ficaria pronta em 1916, quando o observatório já se localizava no morro de São Cristóvão. No entanto, a visita dos reis da Bélgica em 1920 apressou a instituição a montar um instrumento no novo espaço e uma outra luneta, menor, foi colocada. Hoje, no campus do Museu de Astronomia e Ciências Afins, a cúpula faz parte do acervo arquitetônico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional e pode ser visitada.Na segunda metade do século 19, o observatório carecia de verbas para seu funcionamento adequado. Havia uma parcela considerável de ministros e senadores que considerava a astronomia uma ciência distante da sociedade, sem aplicações práticas e imediatas. Para essa ala conservadora, ao invés da ciência, o governo deveria investir no agronegócio, uma vez que as secas ocorridas entre 1877 e 1879 haviam reduzido a produção de alguns dos principais gêneros de exportação do país, como o café. Sem verbas, sem espaço adequado para a montagem da luneta doada pelo imperador e sem funcionários suficientes, o observatório via sua participação no projeto Carta do Céu cada vez mais marcada por obstáculos. Por esses motivos, em 1900, durante novo encontro dos astrônomos participantes do projeto, Cruls afirmou que: "apesar de todo o meu desejo de colaborar na grande obra que o Observatório de Paris iniciou, o Observatório do Rio de Janeiro se vê impossibilitado de realizar as pesquisas que a Comissão gentilmente lhe confiou" encerrando, assim, a participação do Observatório Nacional no projeto Carta do Céu. De forma semelhante, muitos outros observatórios também desistiram do projeto e apenas metade publicou fotografias para a Carta do Céu, que nunca foi concluída.

A ilustração, gravada no primeiro tomo dos Anais do Imperial Observatório do Rio de Janeiro, publicado por Emmanuel Liais em 1887, apresenta um instrumento de observação astronômica com a seguinte legenda: "Grande refrator (objetiva de 34 centímetros) destinado a ser montado como altazimute".Na imagem, observamos o instrumento no centro da figura. Montado entre dois maciços pedestais de alvenaria para garantir estabilidade, o instrumento aponta para o céu. Segundo as informações que constam na publicação, o corpo do instrumento era feito de ferro fundido e pesava cerca de cinco toneladas. O tubo da luneta, com 8 metros e 30 centímetros de comprimento, é acoplado do lado direito do instrumento, enquanto um contrapeso é fixado do lado oposto. Sua montagem azimutal indica que o instrumento pode ser movimentado nos dois sentidos: da esquerda para direita (azimute) e de cima para baixo. Próximos do tubo da luneta, observamos dois homens vestidos com trajes formais. Um deles, de cartola, é geralmente identificado como sendo o próprio imperador Pedro II, que estava na França durante a realização do Congresso Astrográfico Internacional de 1887 realizado no Observatório de Paris. Foi ele o responsável por doar o instrumento, que seria utilizado pelo Observatório Nacional, então Imperial Observatório do Rio de Janeiro, no projeto Carta do Céu. No entanto, o instrumento, que chegou ao Brasil em 1889, nunca foi montado devido a falta de espaço adequado nas instalações do observatório, como já apontado nos Anais do Imperial Observatório do Rio de Janeiro.

Ilustração da luneta doada por D. Pedro II ao Observatório Nacional para o projeto Carta do Céu

Participação do Observatório Nacional no projeto Carta do Céu

Um rótulo de água mineral pode parecer um documento inusitado em meio ao acervo de um cientista. No entanto, diversos historiadores já demonstraram como materiais de publicidade podem revelar informações importantes sobre o contexto cultural e social de uma época. No rótulo seria possível analisar o simbolismo da figura feminina presente no centro. Seria igualmente possível enfocar nos elementos textuais, como o nome da cidade de origem das águas. Passa Quatro, por sua vez, poderia nos levar de volta ao século 17 quando o bandeirante Fernão Dias Paes Leme escreveu para seus companheiros que desbravavam o território de Minas Gerais que deveriam galgar a serra passando quatro vezes pelo rio para chegar ao povoado onde foi fundado o município conhecido por ser uma estância hidromineral. O destaque para a fonte específica de onde foi coletada a água poderia remeter ao “homem erudito” e com “grande pendor para a ciência médica”, segundo os jornais da época, que era o Padre Manoel Vieira, que utilizava as águas para curar os enfermos.O rótulo da água mineral de Passa Quatro também evidencia as relações entre ciência e política. Em destaque entre a figura feminina e o nome do município, encontramos uma referência ao decreto número 6.264 de 11 de setembro de 1940, que autorizava Antônio Cardoso da Silva, dono da Empresa Águas Minerais Passa-Quatro Ltda. a explorar a jazida de água mineral radioativa denominada Padre Manoel. Assinado pelo então presidente Getúlio Vargas, a legislação apresenta diversos elementos científicos, como a determinação geográfica exata do território a que se concedia o direito de exploração. Determinada de forma precisa no globo terrestre, o texto informa as coordenadas geográficas que deveriam ser seguidas para encontrar a área em formato de polígono desenhada pelas estacas demarcadoras. O decreto definia, ainda, que era necessário conservar as fontes naturais, evitando que secassem ou que fossem poluídas e estabelecia que todo o manuseio da área seria supervisionado por órgãos governamentais, como o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), criado em 1934 com a finalidade de garantir o planejamento estratégico e a fiscalização das pesquisas geológicas e minerais no território nacional.Cinco anos mais tarde o decreto 7.841, também assinado por Vargas, determinava que águas minerais “são aquelas provenientes de fontes naturais ou de fontes artificialmente captadas que possuam composição química ou propriedades físicas ou físico-químicas distintas das águas comuns, com características que lhes confiram uma ação medicamentosa” e criava a Comissão Permanente de Crenologia, dedicada ao estudo das propriedades medicinais da água, ligada ao DNPM. Era no DNPM que trabalhava o químico Alexandre Girotto, responsável por guardar em seus documentos o rótulo da água de Passa Quatro, que contém o seu nome na caixa de informações disposta do lado direito. Foi ele quem descobriu que o que fazia a água da “Mina do Padre” benéfica para a saúde não era milagre, mas a presença de elementos radioativos como o tório, que se acreditava ser benéfico para doenças do fígado e rins. É por isso que o rótulo destaca que a água mineral de Passa Quatro é tório radioativa.

Rótulo das Águas Minerais Naturais de Passa Quatro. Ao centro, uma figura feminina com braços levantados segura, em uma das mãos, uma garrafa e, na outra, um copo. Na parte inferior do rótulo há a indicação da Fonte Padre Manoel, o nome da empresa responsável e seus dados de contato. No lado esquerdo é apresentado um quadro com dados do estudo físico, químico e físico-químico da água. No lado direito é apresentado um quadro com as conclusões do estudo, supervisionado por Alexandre Girotto.

Rótulo das águas minerais naturais de Passa Quatro

Análise das águas minerais de Passa Quatro por Alexandre Girotto

O ano de 1887 foi marcado pela realização do Congresso Astrofotográfico Internacional, organizado por Ernest Mouchez no Observatório de Paris. O evento aconteceu no mês de abril e Luiz Cruls, então diretor do atual Observatório Nacional, esteve presente representando a instituição brasileira. Três meses depois, ainda na França, Luiz Cruls visitou um recém inaugurado observatório na cidade de Juvisy-sur-Orge, onde Camille Flammarion, astrônomo e divulgador da ciência, chefiava os trabalhos.A visita aconteceu no dia 29 de julho de 1887 e Cruls estava acompanhado pelo imperador brasileiro D. Pedro II e seu camareiro, Manuel Antônio da Rocha Faria, Visconde de Nioaque. O monarca brasileiro, reconhecido amante da astronomia, membro da Academia de Ciências de Paris, e considerado por Flammarion como "o soberano mais esclarecido do nosso planeta", inaugurou a luneta equatorial do recém fundado observatório. Sentado sobre os degraus da escada de madeira, apontou o instrumento para os céus e observou o planeta Vênus, que encontrava-se próximo ao Sol. Durante a visita, Pedro II também entregou a Flammarion a comenda da Imperial Ordem da Rosa.Embora tenha sido breve, a ilustre visita foi apontada nos livros de registro do observatório e descrita por Flammarion no periódico L'astronomie: revue d'astronomie populaire e em sua autobiografia. Além disso, a passagem do monarca brasileiro também ficou marcada nas terras do observatório francês, onde o imperador plantou uma árvore, um cedro que permanece como testemunho da passagem do imperador brasileiro até os dias de hoje.Nas páginas do L'astronomie, Flammarion resumiu a visita de Pedro II ao seu observatório da seguinte forma: "Todos os que assistiram a esta recepção jamais esquecerão esta bondade paternal, esta simplicidade cordial, aliadas a um conhecimento primoroso dos homens e das coisas".

Gravura inserida na página 321 do periódico francês L'Astronomie: revue d'astronomie populaire, publicado em 1º de janeiro de 1888. Na imagem observamos um homem branco, vestido com trajes formais, sentado sobre os degraus de uma escada de madeira. Com sua longa barba branca característica, o homem é identificado como sendo D. Pedro II. A escada de madeira, com guarda corpo na parte superior, está posicionada em frente a um telescópio astronômico de montagem equatorial, isto é, que permite a movimentação do instrumento de observação astronômica em dois eixos ortogonais que formam um ângulo de 90 graus. Para garantir a precisão das observações, o telescópio precisa ser montado sobre uma base firme e robusta, como aparenta ser o caso. Pelas informações apresentadas no periódico, sabemos que este telescópio estava instalado no observatório francês de Juvisy-sur-Orge, onde trabalhava o astrônomo e divulgador da ciência Camille Flammarion e que o imperador observava, naquele momento, o planeta Vênus. Observamos, ainda, que abaixo da escada podem ser encontrados alguns papeis dispostos em pilha, demonstrando que aquela era uma cúpula onde os astrônomos trabalhavam diariamente e provavelmente utilizavam desse material para registrar suas observações.

Pedro II observando o planeta Vênus no Observatório de Juvisy-sur-Orge, na França

Visita de Pedro II e Luiz Cruls ao Observatório Camille Flammarion em Juvisy-sur-Orge na França

O ano de 1988, quando é promulgada a constituição "cidadã", marca o auge de um processo de abertura política iniciado em 1985. Com o fim da ditadura, o Brasil retoma a democracia presidencialista com um novo governante escolhido pelo povo em eleições diretas. Embora essa seja uma história recente, muito já aconteceu e continua a acontecer diariamente, pois a história não é apenas aquilo que ocorreu no passado; ela é a ciência do homem no tempo: passado, presente e futuro.

História Recente

Desde a década de 1970 o Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE) monitora o território brasileiro por meio de satélites que orbitam o nosso planeta. Esta tecnologia é capaz de receber no espaço orientações enviadas da Terra, elaborar dados por meio de câmeras de alta resolução e sofisticados sensores, e remetê-los de volta. Ao serem captados por antenas receptoras na Terra essas informações são processadas e analisadas por pesquisadores, ajudando a mapear regiões e a gerar dados sobre o clima, oceanos, campos magnéticos, e recursos agrícolas, florestais etc.Ao longo do tempo, o Brasil desenvolveu acordos com países que já mantinham satélites em órbita para obtenção de dados desta natureza, pois o país não possuía um satélite próprio. Alguns desses foram firmados com os Estados Unidos, por meio de agências como a National&nbsp;Aeronautics and Space&nbsp;Administration (NASA), que desde
1972 utiliza satélites da série Land Remote Sensing Satellite (LANDSAT) para o rastreio de grandes superfícies e monitoramento de recursos naturais terrestres.Outro acordo foi feito com a National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), instituição que opera desde 1974 um conjunto de satélites e instalações para obtenção de dados enviados do espaço. Tal estrutura é reconhecida como Geostationary Operational Environmental Satellite Geostacionary (GOES), responsável pela emissão de parte dos dados meteorológicos do continente americano.Os satélites GOES permanecem em órbita geossíncrona, pois seu deslocamento coincide com o movimento de rotação da Terra. Do nosso planeta, eles são vistos como pontos fixos, a qualquer momento do dia, facilitando a captação dos dados por antenas receptoras. Uma característica importante de seus sensores é a possibilidade de obter imagens no infravermelho, técnica usada para medir à distância a distribuição térmica de uma dada região.Foi um satélite deste tipo, distante da Terra mais de 35.000 km, que realizou a super fotografia da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro. Nela é possível identificar pontos elevados do relevo, algumas ilhas do seu interior, como Paquetá e a Ilha do Governador, a foz de vários rios, mas também o processo de ocupação dos seus arredores. Praias, enseadas e regiões de mangue na orla também são mostradas. Quando imagens produzidas com esta tecnologia, são comparadas a imagens atuais, vários estudos podem ser produzidos a fim de demonstrar os impactos da atividade humana no espaço natural, além de terem outras funções nas ciências, na política e na economia.Esta imagem histórica da Baía de Guanabara fez parte de um conjunto de fotografias encaminhadas pelo INPE à imprensa para divulgar a “Missão Espacial Completa Brasileira”, aprovada em 1978. O objetivo desta missão era desenvolver e colocar em órbita um satélite brasileiro, por meio de um veículo lançador também nacional, construindo as bases da futura autonomia do país na coleta de dados por meio de sensoriamento remoto.

Fotografia da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, obtida por meio de satélite de sensoriamento remoto (SMS/GOES) com áreas marcadas por infravermelho. Faz parte do dossiê “Fotografias da Missão Espacial Completa Brasileira”, do Fundo Jacques Danon (AHC-MAST). Fotos doadas pelo INPE e associadas a um texto de divulgação para a imprensa. &nbsp;

Fotografia da Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, obtida por satélite de sensoriamento remoto

Os primeiros acordos internacionais para o sensoriamento remoto do espaço aéreo brasileiro

<h3 class="editor-heading-h3 ltr" dir="ltr">O PROJETO</h3> O Portal de História da Ciência e da Tecnologia no Brasil é um projeto desenvolvido pela Coordenação de História da Ciência e Tecnologia do Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST), situado em São Cristóvão, no Rio de Janeiro. Nosso objetivo é divulgar a história da ciência e da tecnologia brasileira a partir de documentos históricos preservados em instituições de pesquisa, como o próprio MAST. Os documentos digitalizados são cadastrados em uma base de dados onde são inseridas informações sobre sua procedência, autoria, datação, entre outros dados importantes para o conhecimento dos seus contextos de produção e circulação. Além disso, cada documento é associado a um evento na história da ciência e da tecnologia brasileira, que é descrito por especialistas em textos autorais voltados para o público não especializado. Por meio de ferramentas interativas que permitem a construção de linhas do tempo e mapas personalizados, esperamos ser uma fonte de estudos capaz de contribuir para tornar as ciências e os cientistas brasileiros mais conhecidos entre nós. Desde 2019, o projeto foi desenvolvido com recursos do Programa de Capacitação Institucional (PCI) do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) por meio do edital n° 36/2021 - “Apoio à Editoração e ao Audiovisual Comemorativo do Bicentenário da Independência e do Centenário da Semana de Arte Moderna”, e da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP) por meio do projeto “A Cultura Científica no Brasil: Espaços Multiusuários de Ciência e Tecnologia no MAST”. <h3 class="editor-heading-h3 ltr" dir="ltr">A EQUIPE</h3> Coordenação: Heloisa Meireles Gesteira Desenvolvimento e pesquisa: Anderson Pereira Antunes Mariza Pinheiro Bezerra Modelagem do sistema de informação: Sergio Emanuel Dias Campos Base de dados e desenvolvimento do site: Victor Yañez Colaboração: Coordenação de História da Ciência e da Tecnologia (MAST)

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